A GERAÇÃO DE 70 – FAÇA-SE A REVOLUÇÃO!

Na década de 1870 um grupo de jovens lançou um desafio: Faça-se a Revolução! Que se abra uma tribuna e se debata a política, a religião, o ensino, a arte!

Os 150 anos de uma quase Revolução

Em 2021 não quisemos deixar passar os 150 anos da realização das Conferências Democráticas do Casino Lisbonense, da Geração de 70 e do nascimento dAs Farpas (Ramalho Ortigão e Eça de Queiroz).

As Farpas
Capa de As Farpas

Organizámos pela primeira vez uma visita guiada com o propósito de conhecer melhor os antecedentes desta quase Revolução e consequências. No século XX a tentativa de ruptura com um certo status quo só foi igualada pela geração da revista literária Orpheu.

Faça-se a Revolução!

Para o seguidor menos avisado provavelmente estes acontecimentos de 1871 não lhe dirão nada. Por isso mesmo a nossa proposta é acicatar a curiosidade e convidar para esta visita guiada que nos levará numa viagem no tempo, aos anos quentes das Revoluções na Europa, das Monarquias ameaçadas pelo ideal Republicano, pelas ideias do socialismo marxista e proudhoniano.

E como terá Portugal recebido os ecos destas Revoluções? Pela voz e intervenção de Antero de Quental, e de outros que o subscreveram, foram convocadas conferências para que se discutisse abertamente o estado da nação.

Que se abra uma tribuna e se debata a política, a religião, o ensino, a arte! E nada como uma boa polémica para chamar público para ouvir um Antero inflamado pela hora da Liberdade, um Augusto Soromenho a dizer que não se faz boa literatura no país, de um jovem e elegante Eça a proclamar o Realismo como nova forma de arte e Adolfo Coelho a clamar pela separação da Igreja do ensino em Portugal. A proibição das conferências pelo Marquês d’Ávila trará ainda mais ardor à discussão que se prolongaria nos jornais e debates nas cortes.

Antes de haver conferências no Casino havia ali cançonetas. Mulheres decotadas até ao estômago, com os braços nus, a pantorrilla ao léu, a boca avinhada, cantavam, entre toda a sorte de gestos desbragados, um repertório de cantigas impuras, obscenas, imundas! Num verso bestial, a um compasso acanalhado, ridicularizava-se aí o pudor, a família, o trabalho, a virgindade, a dignidade, a honra, Deus! Eram também conferências. Eram as conferências do deboche. E havia muitos alunos!

Pois isso que era a obscenidade, a infâmia, a crápula, parecia ao sr. marquês de Ávila compatível com a moral do Estado!

As conferências, que eram o estudo, o pensamento, a crítica, a história, a literatura, essas pareceram ao sr. marquês incompatíveis com toda a moral!

Homens refastelados, bebendo conhaque, gritando, apupando desgraçadas criaturas que se deslocam em trejeitos vis para fazer rir – isso é permitido por todas as leis!Homens que escutam gravemente uma voz que fala de justiça, de moral, de arte, de civilização – isso é proibido com tanta violência que se salta por cima da Carta para o proibir! A isso manda-se um polícia dar duas voltas à chave! Miserere! Miserere!»

Eça de Queiroz in Uma Campanha Alegre, Julho 1871

E 150 anos depois, como andará a Nação?

A Geração de 70

Entre o Bairro Alto e o Chiado, entre jornais e cafés, a Revolução foi sendo pensada de uma forma rebelde, provocadora. Eram ainda os resquícios da turba coimbrã, seguidora de Antero de Quental, que agora num quarto se reunia. O Cenáculo tornar-se-ia o centro das discussões e tertúlias sobre arte, política, filosofia e religião.

Antero de Quental, faça-se a Revolução
Antero de Quental

Um jovem Eça que se proclamava revolucionário, socialista e até ateu! Neste centro de intelectuais destacavam-se Ramalho Ortigão, Manuel de Arriaga, Guerra Junqueiro, Carlos Mayer, Oliveira Martins, Batalha Reis e tantos outros. Daqui sairá a ideia das Conferências para “ligar Portugal com o movimento moderno”.

E após as Conferências? Que caminhos tomaram os protagonistas? Falaremos do antes, durante e depois deste acontecimento que acabaria por ser efémero mas que permitiu catapultar para a posterioridade, nem que fosse pelas razões mais trágicas, alguns dos intervenientes.

Em 1880 Lisboa assistiu às festas grandiosas do Tricentenário (da morte) de Camões. Embora o tempo fosse de festa popular, de cortejos na cidade, de inaugurações, a “ressureição” do poeta serviu de mote para que socialistas e republicanos reivindicassem mudanças políticas e sociais. Um dos promotores foi Teófilo Braga, companheiro de Antero de Quental na polémica Questão Coimbrã. Ramalho Ortigão pediria a Cesário Verde um poema inspirado em Camões. Eça estava em Inglaterra e à distância comentaria desta forma o Tricentenário:

«Dir-me-ão que eu sou absurdo, ao ponto de querer que haja um Dante em cada paróquia e de exigir que os Voltaires nasçam com a profusão dos tortulhos. Bom Deus, não! Eu não reclamo que o país escreva livros, ou que faça arte: contentar-me-ia que lesse livros que já estão escritos e que se interessasse pelas artes que já estão criadas.»

Maria Filomena Mónica, in Eça de Queirós, Quetzal Editores, 2001, pág. 187

Esta geração que quis abrir Portugal à discussão teve uma existência efémera. Algum do espírito seria recuperado anos mais tarde, numa forma mais prazenteira de jantares luxuosos e num estilo de bon-vivants, pelo grupo então denominado Os Vencidos da Vida.

Grupo os Vencidos da Vida
Grupo Os Vencidos da Vida (no jardim do Conde de Arnoso, Lisboa)

Outras Revoluções

Em 2022 evocam-se os 200 anos da Independência do Brasil e os 200 anos da primeira Constituição portuguesa. E sem esquecer a Revolução Liberal de 1820 que abriu caminho ao novo século. Não poderemos compreender a Regeneração sem olhar para os primeiros cinquenta anos do século XIX.

Na visita guiada “A Geração de 70” serão igualmente evocadas estas outras Revoluções para compreender a 2ª metade do século XIX e os caminhos que levariam à proclamação da República em 1910.

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Saiba mais sobre a Geração 70 e as revoluções do século XIX na nossa visita guiada
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